Julyete Louly
Hiperativa Comunicação
Apesar da extensa programação, o 11º Congresso Brasileiro de Cooperativismo de Crédito (Concred), realizado entre os dias 28 e 30 de setembro, no Rio de Janeiro, não deixou de reconhecer o trabalho daqueles que construíram e continuam construindo o cooperativismo de crédito no país. A Confederação Brasileira das Cooperativas de Crédito (Confebras), organizadora do evento, homenageou seus ex-presidentes, entre eles o associado ao Sicoob Executivo Marconi Lopes de Albuquerque, que a presidiu entre 1997 e 2004. Servidor público desde 1973 e atuante no cooperativismo dentro do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), Marconi possui um histórico relevante de contribuição ao cooperativismo de crédito no país. Economista, ele também já presidiu o Sicoob Executivo, antiga Coominagri, e o Sicoob Planalto Central, que ajudou a fundar, além de participar do processo de criação do Banco Cooperativo do Brasil (Bancoob). Na bagagem, ainda, a presidência de três Concreds (o de 2000, em Brasília; o de 2002, em Santos; e o de 2004, em Belém). Formado em Economia, possui mestrado na área pela Universidade do Ceará, MBA em Administração de Cooperativas na Itália e em Agronegócio pela Universidade de Brasília. Trabalhou dez anos para o Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA). Atuou nas áreas de finanças e orçamentos da Secretaria de Planejamento Agrícola do MAPA e no Departamento de Cooperativismo e Associativismo Rural (Denacoop). Atualmente, é coordenador-geral de Apoio às Câmaras Setoriais e Temáticas do Ministério.
1 – O que sentiu ao receber essa homenagem no 11° Concred e o que achou do congresso, de forma geral?
Fiquei muito feliz por poder constatar a grandeza do Concred e pelo reconhecimento que recebi, sobretudo por reencontrar personalidades do cooperativismo. É muito gratificante receber cumprimentos de pessoas que não vejo há muito tempo, mas que ainda lembram das minhas realizações. Eram mais de 1400 congressistas e a organização estava impecável, com palestras relevantes. Os temas escolhidos são de extrema importância para o cooperativismo. A governança destaca a necessidade de renovação dentro das instituições, formando novos líderes sempre. A inovação, que deve se aliar à criatividade e tecnologia, para superar momentos de crises, por exemplo, e reduzir custos. E a sustentabilidade, que é uma preocupação presente em todos os empreendimentos hoje em dia e da qual depende a longevidade de uma empresa que queira ter compromisso com o futuro.
2 – Quais foram suas principais realizações na presidência da Confebras?
Como dirigente da Confebras, presidi o Concred de Santos, em 2002. E por ter sido realizado num ano eleitoral, convidamos quatro candidatos à presidência da República, mas somente Lula participou e prometeu cumprir nossas recomendações, caso fosse eleito. Entre elas, estava a alteração no artigo da Lei 8.112/90, do Estatuto do Servidor Público, que proibia que os servidores exercessem cargos de direção e gerência em sociedade civil (naquela época, as cooperativas eram consideradas sociedade civil). Enquanto o Banco Central determinava que alguém só podia ser eleito diretor de uma cooperativa se fizesse parte do quadro social da comunidade criadora. A punição era a demissão e mais de mil servidores estavam nessa situação. Então, gerava um conflito de lei. Foi muito tempo de articulação e por conta de um conhecido, consegui marcar com rapidez reunião com o Presidente da República para criação de uma comissão, inclusive, ajudei a redigir a proposta de reforma da lei. No Dia Mundial do Cooperativismo, o ex-presidente chamou todas as lideranças cooperativistas no Palácio do Planalto e anunciou a alteração no artigo e outras medidas. Foi algo lindo.
Além dessa alteração no artigo da Lei 8.112/90, quando assumi a Confebras encampamos uma grande luta pela permanência das cooperativas de modelo Luzzatti, o modelo de livre admissão. O Bacen só permitia a criação de cooperativas dentro de uma categoria profissional e publicou em 2000 resolução determinando o fim delas em um ano. Acompanhei o trabalho dessas cooperativas, principalmente, a de Guarulhos, em São Paulo, e a de Mendes, no Rio de Janeiro. Como a Confebras tinha reconhecimento no exterior, usei isso para pedir apoio a entidades internacionais e levamos dirigentes do Bacen conosco para que vissem que esse modelo ainda dava certo, além de articulação política aqui no Brasil. O grande resultado disso foi que a decisão foi revogada e, mais tarde, a aprovação pelo Bacen das cooperativas de livre admissão.
3 – Quais foram suas principais realizações no Sicoob Executivo?
Eu era sócio, mas não era muito atuante. Via muitos colegas reclamando da cooperativa e começaram a pedir para eu atuar no cooperativismo por já ter trabalhado com alguns movimentos de igreja. Até que um dia, o conselheiro Adilson Tadeu, que trabalhava na Senacoop (Secretaria Nacional de Cooperativismo) do Ministério da Agricultura me convidou para criar uma chapa para a eleição da cooperativa. Conseguimos ser eleitos e assumi em 89. Com o Plano Collor, a cooperativa ficou com apenas um funcionário e tivemos que encontrar novos funcionários e novo espaço para a cooperativa. Trabalhávamos até tarde da noite para fazer manual que ainda não existia.
O resultado dos nossos esforços foi uma revolução na cooperativa e o crescimento dela na época, chegando a ser a segunda cooperativa com mais ativos no DF. Fiquei nela por cinco anos, inicialmente, de 89 a 1994. Saí e depois fiquei mais três anos.
4 – Tem outras experiências no cooperativismo de crédito?
Em 1995, como eu tinha feito um MBA na Itália e meu trabalho final era a criação de uma central para o DF, quando retornei da viagem, já comecei a trabalhar nisso. Assim, criamos a nossa Central, a Cooperativa Central de Crédito do Distrito Federal Ltda. (Cecredif), que hoje é o Sicoob Planalto Central. Fundei e presidi a central por três mandatos, depois voltei mais tarde e saí novamente. Até então, tínhamos uma federação, a Fecobras, da qual eu era vice-presidente. Entretanto, as federações cuidavam mais de educação cooperativista, integração e não da parte financeira.
Em meados de 1997, integramos a cooperativa no Sistema Sicoob e partimos para construir o Bancoob. Foi uma batalha porque o Bacen não aprovava de jeito nenhum. Precisamos de muita negociação, articulação política no Congresso Nacional com a Frente Cooperativista, visitas e viagens com diretores do órgão para que tivessem uma visão mais ampla, até que aprovaram. Os presidentes das centrais se reuniram para contratar a equipe de gestores do banco cooperativo e definir como ele seria. O DF tem uma participação importante na história do cooperativismo financeiro nacional.
Além dessas atuações, quando o governo Collor entrou, em 1990, extinguiu a Senacoop do Mapa. Então, eu, Adilson Tadeu e outros colegas começamos a trabalhar na criação do Denacoop, que existe até hoje e fomenta todos os ramos do cooperativismo. Nossa equipe viajou o mundo para trazer o melhor sobre o tema, promovendo palestras lá fora e participando de vários congressos.
5 – Como você percebe o cooperativismo no Brasil de hoje?
O que vejo de ruim hoje em dia é a bancarização do cooperativismo, porque nós sempre quisemos ter nosso banco e não ser um. A cooperativa nasce para ser uma alternativa a isso e deve oferecer ao cidadão a melhor alternativa de custo, crédito e aplicação de recurso. Ela tem que ser diferente de um banco, caso contrário, não está cumprindo sua função social. A essência dela é ser célula de desenvolvimento daquela localidade, empresa. O que vejo hoje é que o quadro social não participa muito das cooperativas e isso gera risco das instituições entrarem em colapso. A perpetuação dos dirigentes nos cargos também é um desafio e é saudável a mudança. É preciso dar espaço para novos líderes. As estruturas que geram custos elevados devem ser repensadas para redução aliada à integração operacional. Esses pontos precisam ser trabalhados para garantir a longevidade do sistema.
Edição: Elizângela Araújo